O “Risco” é nosso inimigo?
Toda atividade realizada, decisão tomada ou evitada — individualmente, em grupo ou em um ambiente empresarial — envolve algum nível de risco.
Dirigir até o trabalho, conversar com clientes, convidar alguém para sair, voar, investir em ações, comprar ou iniciar um negócio, contratar um novo funcionário, comprar uma casa, envolvem certo grau de risco.
Independentemente do efeito (um pequeno incômodo versus uma perda grave ou catastrófica), o risco não pode ser evitado.
Mas o risco é realmente nosso inimigo?
O risco é inevitável; e por ser inevitável, ele não pode ser nosso inimigo.
Como alguém ou alguma entidade poderia estar completamente cercado pelo inimigo e ainda assim experimentar crescimento e sucesso? Não pode; portanto, o risco não é o inimigo. Além disso, o risco NÃO é nosso inimigo por causa da sua “ironia”.
A “ironia” do risco é: sem risco, não há recompensa; e frequentemente, quanto maior o risco, maior a recompensa.
O risco é necessário para que indivíduos ou sociedades inovem e prosperem. O risco é essencial para o progresso da vida, das pessoas e da sociedade.
Ninguém assume um risco ou participa de um empreendimento arriscado esperando que seus esforços fracassem, desmoronem ou causem prejuízos a si ou aos outros. Na verdade, o oposto é verdadeiro: indivíduos e empresas assumem riscos calculados com a intenção de melhorar sua posição no mundo e, com sorte, contribuir positivamente com a sociedade.
Então, quem é o inimigo, se não é o risco? O que deve ser mais temido do que a onipresença do risco?
A ignorância sobre o risco e/ou a apatia em relação a ele são os verdadeiros inimigos.
Elas atuam isoladamente ou em conjunto para dificultar o gerenciamento adequado dos riscos existentes por parte de indivíduos ou organizações — quer essas pessoas ou entidades admitam a existência dos riscos ou queiram gerenciá-los ou não.
Sun Tzu, em seu tratado A Arte da Guerra, declarou: “Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas.” Isso significa que, se a pessoa ou entidade conhece a si mesma — seus pontos fortes, fracos e ameaças — e conhece seu inimigo — ignorância ou apatia em relação ao risco —, vencerá todas as batalhas contra o risco, seja por meio do controle eficaz ou do financiamento eficiente.
Gerenciar risco é como preparar-se para e engajar-se em uma batalha.
Para vencer a batalha contra o risco, indivíduos e organizações devem saber se a ignorância ou a apatia em relação ao risco é o inimigo pessoal ou corporativo. Se a pessoa ou a entidade não estiver disposta ou não for capaz de identificar seu inimigo, todas as batalhas contra o risco serão perdidas. (“Prefiro ter sorte do que ser bom” aplica-se apenas ao golfe — não à vida ou aos negócios.).
A apatia em relação ao risco não é um inimigo que possa ser gerenciado; nem pode ser derrotado. Cuidado com os apáticos e evite se associar a eles de qualquer forma. Qualquer pessoa ou empresa que não esteja preocupada em conhecer e entender os riscos envolvidos é perigosa. O fracasso e a perda financeira — e possivelmente até a ruína — são inevitáveis.
A ignorância sobre o risco é um inimigo que pode ser superado — com esforço. Vencer o inimigo da ignorância requer educação e treinamento para descobrir: (1) o que é risco; (2) o que está em risco; e (3) o efeito final do risco considerado.
O desejo é tudo o que se exige para superar o inimigo da ignorância; onde há desejo, não há apatia. Indivíduos e entidades devem desejar estudar, de forma honesta e lógica, a atividade (ou inatividade) que gera risco, suas consequências potenciais e como gerenciá-las. A ignorância não é fatal, desde que seja temporária.
Compreender e gerenciar riscos é chamado, previsivelmente, de “gestão de riscos”. A pessoa cuja função é gerenciar riscos é chamada de “gestor de riscos”. Esses termos, embora descritivos, são limitantes.
Primeiro, a gestão de riscos não é uma atividade pontual; uma boa gestão de riscos é um processo contínuo, pois os riscos a que uma pessoa ou entidade estão expostas estão sempre mudando — assim como a própria pessoa ou entidade. Segundo, embora alguns tenham o título oficial de “gestor de riscos”, é papel de todos na organização compreender e ajudar a gerenciar os riscos. Em certo sentido, todos os funcionários são “gestores de riscos”.
O que é Risco?
Como o risco é inevitável e deve ser gerenciado, ele precisa ser compreendido; para ser compreendido, deve ser definido.
No entanto, definir risco pode ser problemático, pois existem quase tantas definições quanto profissões.
Economistas, estatísticos, atuários, cientistas, investidores e até gerentes de crédito têm definições próprias e específicas do termo “risco”. No entanto, este artigo foca e aplica a definição de risco relevante para os profissionais de seguros e de gestão de riscos.
Risco, como usado aqui, é definido como:
“Incerteza em torno de um resultado decorrente da falta de conhecimento sobre eventos futuros.”
A incerteza, conforme usada nessa definição, envolve três requisitos:
Ninguém sabe o que vai acontecer;
Para que exista risco, deve haver incerteza e a possibilidade de um resultado desfavorável. Considere esses requisitos da seguinte forma:
O que está “em risco”? O que possui risco?
O risco exige um resultado incerto combinado com a possibilidade de um resultado desfavorável; mas como essa informação ajuda alguém ou uma organização a planejar o futuro? Saber o que é risco não significa saber o que está em risco.
A primeira frase deste artigo afirma que tudo o que uma pessoa ou entidade faz envolve risco. Embora seja verdade, listar “tudo” é difícil. O que está “em risco” pode ser classificado em oito categorias amplas de exposição ao risco:
Incidentes que não são evitados — ou que não podem ser evitados — em qualquer uma dessas áreas podem resultar em perda para o indivíduo ou organização.
Perda é definida como uma desvantagem ou privação resultante de um incidente desfavorável.
Algumas perdas podem ser catastróficas, enquanto outras não passam de incômodos temporários, dependendo dos fatos e de quem sofre a perda.
Corrigindo a Terminologia
Cada termo tem significado específico em seguros e gestão de riscos. Em inglês. “Peril” e “Hazard” possuem a mesma tradução em português, que seria “Perigo”.
Mas é importante entendermos a sutil diferença entre esses dois termos e tentarmos encontrar palavras diferentes para defini-los.
Perigo como Hazard:
Refere-se a um perigo ou risco inerente a algo, que pode causar danos ou problemas se não for evitado ou controlado. É um termo mais amplo, que pode se referir a qualquer situação, objeto ou circunstância que possa causar perigo. A janela quebrada é um perigo/hazard - pode causar cortes ou quebra.
Perigo iminente como Peril:
Refere-se a um perigo iminente e grave, uma situação de risco imediato e sério. É um termo mais forte e dramático, que sugere uma ameaça que pode resultar em danos graves ou até mesmo na morte. “Os alpinistas estavam em perigo durante a tempestade - estavam em iminente perigo de vida”
Em resumo: "Perigo/Hazard" é um perigo geral, enquanto "Peril" é um perigo iminente e grave.
A relação entre eles é: quanto maior o Perigo/Hazard, maior a chance do perigo iminente/Peril; quanto maior a chance do perigo iminente/Peril, maior a probabilidade de perda.
Ou seja: controlar o Perigo/Hazard reduz a probabilidade de perda.
Perigos/Perils causam perdas, lesões ou danos (o evento indesejado).
Os perigos são classificados em três tipos:
A gestão de riscos inclui o preparo financeiro para perdas causadas por esses eventos. (O seguro é um dos mecanismos abordados mais adiante).
Algumas perdas podem ser cobertas por seguros; outras estão fora do que se considera “assegurável”.
Perigos/Hazards aumentam a probabilidade de que um Perigo Iminente/Peril cause uma perda financeira, lesão corporal ou dano à propriedade. Existem cinco tipos de Perigos/Hazards que devem ser gerenciados:
Se risco é a incerteza de um evento indesejado, e Perigos/Hazards aumentam a chance desse evento, então evitar ou mitigar Perigos/Hazards previsíveis é o primeiro passo da gestão eficaz de riscos.
Reduzir ou eliminar os Perigos/Hazards diminui o risco (incerteza) de perda.
Classificações de Risco
O risco é dividido em quatro categorias amplas com base em seu efeito financeiro sobre o indivíduo ou entidade, em como gostos e tendências alteram o risco, em quão individual ou disseminado ele é, e nos possíveis resultados desse risco.
Todo risco pode ser classificado como:
Risco Financeiro versus Não Financeiro
Um risco financeiro prejudica financeiramente quem o sofre, ou seja, trata-se de uma perda financeira mensurável. A perda total de uma propriedade avaliada em $200.000 é um exemplo de perda financeira mensurável. A estrutura deixa de ser utilizável, portanto, o proprietário perde o valor do imóvel. Além disso, ele perde o valor da renda gerada pela existência da estrutura (a “receita do negócio”). A perda do imóvel e da renda produzida são ambas financeiras e mensuráveis.
Já os riscos não financeiros são tão reais quanto os financeiros, mas não podem ser medidos com precisão. O máximo que se pode esperar é uma estimativa dos danos causados.
Por exemplo, qual é o valor da perda da reputação de uma pessoa ou empresa? Quanto valem os “clientes” ou o “ponto do negócio” (goodwill)? Embora a perda de reputação ou de clientes tenham um impacto financeiro, não há como medir esse custo com precisão. Esses são considerados riscos não financeiros.
Risco Dinâmico versus Estático
Riscos dinâmicos mudam constantemente. Eles oscilam com alterações na economia, gostos, tendências, regulamentações ou tecnologia.
Podem ser vistos como “riscos de negócios”, sujeitos às condições e ao mercado.
Por outro lado, riscos estáticos não estão sujeitos a fatores externos. Eles não mudam, independentemente da economia, gostos, tendências ou tecnologia.
Risco Fundamental (ou Difuso) versus Particular
Um risco é fundamental quando afeta toda a sociedade ou uma grande quantidade de pessoas simultaneamente. São riscos sociais ou catástrofes coletivas. Exemplos incluem condições econômicas gerais e desastres naturais como inundações, terremotos ou furacões. Em geral, estão fora do controle do indivíduo ou da entidade.
Riscos particulares, como o nome sugere, são específicos de um indivíduo ou empresa. São próprios e controláveis, em certa medida, por quem está exposto a eles.
Risco Puro versus Especulativo
O risco puro tem apenas dois resultados possíveis: (1) nada acontece ou (2) algo ruim acontece (perda financeira). Por exemplo, uma casa pode permanecer intacta ou pode pegar fogo.
O risco especulativo compartilha esses dois resultados, mas também inclui a possibilidade de algo bom acontecer. Assim, os três possíveis resultados são: (1) nada muda, (2) pode haver ganho financeiro ou (3) pode haver perda financeira.
Investimentos são exemplos de risco especulativo. O investidor pode empatar, lucrar ou perder. Jogos de azar também se enquadram aqui. (Investir e apostar não são a mesma coisa. Investimentos geralmente afetam todas as partes envolvidas; no jogo, há um vencedor, um perdedor e a vantagem da “casa”).
Ambos os riscos envolvem exposição financeira. A diferença está nos possíveis resultados e no objetivo do risco. Um pode ser segurado; o outro, apenas protegido (hedge).
Elementos Primários de um Risco Segurável
Embora o seguro não seja gestão de risco por si só, ele é uma ferramenta dentro dela. O seguro é um mecanismo financeiro usado para cobrir perdas causadas por um perigo, originado por um risco que não pôde ser totalmente evitado.
Em resumo, o segurado troca um valor conhecido (o prêmio) por proteção contra um resultado incerto.
Mas nem todo risco é segurável. Um risco é segurável quando:
Esses são os principais critérios. Outros fatores podem excluir a cobertura. Mais a frente abordaremos mais elementos do risco segurável e também as exclusões.
Riscos que não se enquadram nessas categorias ainda podem causar perdas. Embora não seguráveis, eles podem ser protegidos por meio de hedge (proteção financeira). Exemplos: contratos futuros, opções, derivativos. O hedge evita flutuações de valor ou falência total.
Mensuração do Risco
O risco, por definição, é incerto. Saber que algo pode acontecer não é o mesmo que saber quando ou com que frequência isso acontecerá.
Portanto, os riscos têm graus diferentes de incerteza.
Algumas decisões ou atividades são mais arriscadas que outras. O desafio para os profissionais é diferenciar comportamentos arriscados dos que não são. Para isso, é preciso equilibrar a chance de o evento ocorrer com a gravidade de seu impacto.
Risco é medido por sua frequência (probabilidade) e severidade (gravidade). Frequência é a chance de ocorrência; severidade é o quão catastrófico o evento pode ser.
Ambos se baseiam em probabilidades.
O termo “catastrófico” não é universal: o que é devastador para um pode ser insignificante para outro.
Veja o exemplo abaixo:
Perda Catastrófica versus Não Catastrófica
Uma empresa da Fortune 100 possui prédios nos EUA. Um deles, de 300 m², vale $225.000 e pega fogo. A empresa reconstrói com seus próprios recursos. Para ela, é apenas um transtorno.
Agora imagine uma pequena empresa que financia a compra do mesmo prédio. Um ano depois, ocorre o mesmo incêndio. Ela ainda deve 9 anos do empréstimo e só tem $100.000 em caixa. Para ela, a perda é catastrófica.
O valor do dano é o mesmo, mas a situação financeira de quem sofre o dano muda tudo. Logo, o conceito de catastrófico é relativo.
Frequência
Frequência é a chance de um evento acontecer. Vai de 0% (nunca acontecerá) a 100% (certamente acontecerá). Esses extremos eliminam o risco, pois não há incerteza.
Se a chance está entre 0% e 100%, há risco e ele pode ser quantificado. Julgar frequência requer histórico e prazo de exposição razoável. Por exemplo, a FEMA (Federal Emergency Management Agency - é a agência federal dos Estados Unidos responsável por coordenar a resposta a desastres naturais e outras emergências) afirma que uma casa em zona de risco de inundação tem 26% de chance de sofrer danos em 30 anos.
Estatísticas são apenas previsões; não garantem nada.
Julgar frequência é arte, ciência e adivinhação. Com uma frequência estimada, decide-se se é baixa ou alta.
Segundo a FEMA, o risco é alto quando há mais de 1% de chance de perda por ano. Mas cada um deve definir o que considera alta frequência.
Severidade
Severidade é o impacto financeiro da perda. Nem toda perda grave é catastrófica, mas ainda pode causar dificuldade.
Para avaliar a severidade, deve-se considerar a soma das perdas. Roubo em lojas e furtos internos, por exemplo, podem ter efeitos cumulativos severos.
Assim como a frequência pode agravar a severidade, a severidade também influencia a frequência. Um roubo por ano pode ser suportável, 300 por ano, devastador.
Gerenciamento do Risco
A gestão eficaz do risco requer equilíbrio entre frequência e severidade. As perguntas a responder são:
Com essas respostas, é possível escolher entre quatro estratégias de gerenciamento:
Matriz de Frequência/Severidade para Gerenciamento de Risco
Reunindo os conceitos de frequência, severidade e os quatro métodos de gestão de risco, obtém-se uma matriz que ajuda a visualizar as melhores estratégias para cada risco.
O Impacto do Risco
O risco e sua gestão têm mais do que um impacto financeiro sobre indivíduos e organizações. Quando bem compreendido, o risco possui cinco impactos principais:
• Tempo de planejamento: É necessário tempo para planejar e se preparar para o desconhecido. Uma ou várias pessoas devem, de forma intencional, planejar para o risco. Isso faz parte do processo de gestão de riscos detalhado mais à frente.
• Desembolso financeiro: É preciso reservar e utilizar dinheiro para evitar ou minimizar o impacto de um evento indesejado. Isso pode incluir a contratação e uso de consultores, implementação de medidas de controle de perdas e segurança, investimento em equipamentos de proteção individual, entre outras despesas semelhantes.
• Financiamento alternativo: A aquisição de seguros ou o uso de outras fontes para financiar uma perda.
• Gestão de perdas: Alguém deve investir seu tempo na gestão do processo de perda após o evento indesejado. Isso inclui o gerenciamento do público (gestão de crises), preenchimento de formulários de comprovação de perda, gerenciamento do processo de reconstrução, tempo no tribunal e/ou reconstrução da reputação da empresa.
• Recuperação após a perda: Após um evento inesperado/indesejado, levará tempo para que a entidade retorne às suas capacidades e renda anteriores à perda. Para indivíduos, levará tempo para substituir roupas e outros bens pessoais.
Em última análise, o impacto do risco é a perda de tempo e dinheiro — ou o “custo de oportunidade.” Dinheiro gasto com prêmios de seguro ou fontes alternativas de financiamento (ou com pagamento de perdas não cobertas) não estará mais disponível para outras necessidades; e o tempo gasto planejando, gerenciando ou se recuperando de um evento inesperado está perdido e não pode ser utilizado para outras atividades.
Revisão do Capítulo